Exercícios sobre Guimarães Rosa
(Enem - 2011)
“Quem é pobre, pouco se apega, é um giro-o-giro no vago dos gerais, que nem os pássaros de rios e lagoas. O senhor vê: o Zé-Zim, o melhor meeiro meu aqui, risonho e habilidoso. Pergunto: — Zé-Zim, por que é que você não cria galinhas-d‘angola, como todo o mundo faz? — Quero criar nada não... — me deu resposta: — Eu gosto muito de mudar... [...] Belo um dia, ele tora. Ninguém discrepa. Eu, tantas, mesmo digo. Eu dou proteção. [...] Essa não faltou também à minha mãe, quando eu era menino, no sertãozinho de minha terra. [...] Gente melhor do lugar eram todos dessa família Guedes, Jidião Guedes; quando saíram de lá, nos trouxeram junto, minha mãe e eu. Ficamos existindo em território baixio da Sirga, da outra banda, ali onde o de-Janeiro vai no São Francisco, o senhor sabe.”
ROSA, J. G. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: José Olympio (fragmento).
Na passagem citada, Riobaldo expõe uma situação decorrente de uma desigualdade social típica das áreas rurais brasileiras marcadas pela concentração de terras e pela relação de dependência entre agregados e fazendeiros. No texto, destaca-se essa relação porque o personagem-narrador
a) relata a seu interlocutor a história de Zé-Zim, demonstrando sua pouca disposição em ajudar seus agregados, uma vez que superou essa condição graças à sua força de trabalho.
b) descreve o processo de transformação de um meeiro — espécie de agregado — em proprietário de terra.
c) denuncia a falta de compromisso e a desocupação dos moradores, que pouco se envolvem no trabalho da terra.
d) mostra como a condição material da vida do sertanejo é dificultada pela sua dupla condição de homem livre e, ao mesmo tempo, dependente.
e) mantém o distanciamento narrativo condizente com sua posição social, de proprietário de terras.
Alternativa “d”. No trecho citado do livro Grande Sertão: Veredas, Guimarães Rosa expõe a realidade da desigualdade do Nordeste, ocasionada principalmente pela concentração de terras e pela dependência do sertanejo em relação a seu patrão. Apesar de ser um homem livre, Zé-Zim depende da proteção do patrão.
— Nonada. Tiros que o senhor ouviu foram de briga de homem não, Deus esteja. Alvejei mira em árvore, no quintal, no baixo do córrego. Por meu acerto. Todo dia isso faço, gosto; desde mal em minha mocidade.
*Nonada: pode-se traduzir o significado de “nonada” como se o signo fosse um nome: “o nada”, “coisa alguma”; como um pronome substantivo: “nada”; como um advérbio: “em lugar algum”, “em parte alguma”, “no nada”; como uma predicação: “algo não é coisa alguma”, “isso é nada”, “algo é no nada”, “algo é nada”.
Acompanhado dos chefes-de-turma ― que ele dava patente de serem seus sotenentes e oficiais de seu terço ― Zé Bebelo, montado num formudo ruço-pombo e com um chapéu distintíssimo na cabeça, repassava daqui p’r’ali, eguando bem, vistoriava.
*Formudo: formudo = formoso + sufixo de grau 3 aumentativo de adjetivo –udo.
Os fragmentos que você leu acima fazem parte do romance Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa. A partir da leitura dos trechos, é possível observar uma grande característica da linguagem desse escritor:
a) uso constante de figuras de sintaxe.
b) emprego de empréstimos linguísticos.
c) uso constante de figuras de linguagem.
d) gosto pelos neologismos semânticos e sintáticos.
Alternativa “d”. A originalidade da linguagem de Guimarães Rosa é uma de suas principais características. Para recriar a fala do sertanejo, Guimarães Rosa abusou dos neologismos semânticos e sintáticos, resgatando termos em desuso e criando novas palavras.
(PUCCAMP)
Leia o seguinte trecho de Guimarães Rosa:
"E desse modo ele se doeu no enxergão, muitos meses, porque os ossos tomavam tempo para se ajuntar, e a fratura exposta criara bicheira. Mas os pretos cuidavam muito dele, não arrefecendo na dedicação.
– Se eu pudesse ao menos ter absolvição dos meus pecados!...
Então eles trouxeram, uma noite, muito à escondida, o padre que o confessou e conversou com ele, muito tempo, dando-lhe conselhos que o faziam chorar.
– Mas, será que Deus vai ter pena de mim, com tanta ruindade que fiz, e tendo nas costas tanto pecado mortal?
– Tem, meu filho. Deus mede a espora pela rédea, e não tira o estribo do pé de arrependimento nenhum...
E por aí a fora foi, com um sermão comprido, que acabou depondo o doente num desvencido torpor."
O trecho acima representa a seguinte possibilidade entre os caminhos da literatura contemporânea.
a) ficção regionalista, em que se reelabora o gênero e se revaloriza um universo cultural localizado.
b) narrativa de cunho jornalístico, em que a linguagem comunicativa retoma e reinterpreta fatos da história recente.
c) ficção de natureza politizante, em que se dramatizam as condições de classes entre os protagonistas.
d) prosa intimista, psicologizante, em que o narrador expõe e analisa os movimentos da consciência reflexiva.
e) prosa de experimentação formal, em que a pesquisa linguística torna secundária a trama narrativa.
Alternativa “a”. Uma das principais características da obra de Guimarães Rosa é a capacidade de transpor os limites do espaço regional para alcançar uma dimensão universal.
Sobre as características da prosa de Guimarães Rosa, é correto afirmar:
I. Observa-se o tratamento estético dado à matéria-prima da literatura: a palavra. Para Guimarães Rosa, a forma, o metro e o ritmo são elementos indispensáveis às suas narrativas.
II. A linguagem de Guimarães Rosa é permeada por neologismos, arcaísmos e pela exploração sonora, sintática e semântica do português.
III. Uma das principais características da obra de Guimarães Rosa é a reflexão sobre a criação artística. Para o escritor, a poesia é fruto de um trabalho árduo, racional, que implica fazer e desfazer o texto até que ele alcance a sua forma mais adequada.
IV. O escritor apresenta momentos de intenso intimismo, apresentados por meio de uma linguagem elevada e abstrata e com imagens recorrentes, retomando assim os ideais dos escritores simbolistas.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas II está correta.
c) I, III e IV estão corretas.
d) I e II estão corretas.
Alternativa “b”.